quarta-feira, 20 de julho de 2016

Caminhar sobre as águas: "The floating piers"


 “Flutuante como uma alma que toma vida, iridescente com sons de cores sempre novas, de 18/6 a 3/7,  o projeto de Christo na Itália reinterpretará  o Lago d’Iseo. Através de um sistema modular de ponte flutuante que liga Sulzano a Monte Isola, com a obra “The Floating Piers” Christo permite aos visitantes viver a experiência de caminhar sobre a água.”

A descrição acima dessa obra singular está longe de narrar o impacto que tal experiência estética promove... Afinal, o artista é conhecido por desencadear processos artísticos no ambiente em que a paisagem é transformada por sua obra. No entanto, a obra do artista acaba transformando não apenas o entorno  mas as próprias pessoas que aceitam o convite e vivenciam sua proposta.

O artista búlgaro ousou impactar e transformar monumentos e paisagens em todo o mundo e sua obra no Lago d’Iseo “repropõe o contraste entre a fluidez da água e a rigidez da terra” como o fez em outros trabalhos desenvolvidos em Miami, California, Paris, Berlim,  Nova Iorque. Sua marca de estilo é o tecido que predomina em suas obras presentes  em suas instalações.  No convite para conhecer tal arte,  o artista diz que “The Floating Piers  não é só uma obra para admirar, mas para viver, tocar, pisar, caminhar, de preferência de pés descalços” .

E eu tive a felicidade de viver tal experiência num lindo dia de sol, o que possibilitou perceber as nuances das cores que refletiam na superfície do tecido modificando as tonalidades conforme a incidência da luz.

A leveza, o brilho e o movimento de caminhar nessa passagem flutuante se  iluminavam com o brilho do sol contrastando com o azul da água, emoldurada pelo verde da montanha.

Nessa experiência estética, uma questão me intrigava sobre a fugacidade desse tipo de proposta: o que justifica o tempo de realização da obra em torno de 7 meses e apenas 15 dias aberto ao público? Mas parece que é justamente aí que a obra se justifica: no pouco tempo de fruição, que reside a intensidade da proposta.


E nessa intensidade, um tempo que se eterniza em cada um que teve o prazer de ali estar, ver, passar, sentir, viver ...

quinta-feira, 14 de julho de 2016

Estilos de Aprendizagem em questão

No VII Congresso Mundial de Estilos Aprendizagem que aconteceu em Bragança, Portugal, nos dias 4 a 6/7/2016, diversos temas ancoraram as discussões do evento: Estilos de Aprendizagem e Estilos de Ensino, Tecnologias de Informação e Comunicação; Estilos de Aprendizagem e Espaços Virtuais de Educação; Estilos de Aprendizagem, Inovação e Liderança.

Num primeiro momento, ao discutir os horizontes e as perspectivas a respeito dos  Estilos de Aprendizagem, a ênfase nas críticas dos neurocientistas de abordagem anglo-saxão. Para Domingo Galego e Catalina Alonso, da UNED/Espanha, tais argumentos críticos se referem a outro tipo de classificação, algo mais geral, e não a respeito da metodologia com a qual trabalham, que classifica os estilos de aprendizagem: reflexivo, ativo, teórico, pragmático.  Eles rebatem a crítica de que “a produção científica é insuficiente” com o argumento de que há muitos estudos a respeito, mas que foram publicados em outros idiomas e que grande parte dos pesquisadores anglo-saxões não lê produções que não sejam na língua inglesa. Para eles, os estudos reforçam que o argumento principal reside na importância de compreender os estilos de aprendizagem dos alunos para adequar os métodos de ensino de acordo com tais preferências. No entanto, essa questão é muito complexa e nada como um evento acadêmico para tal discussão, ainda que por vezes na contra-mão da tendência dominante.

Na apresentação do trabalho, foi possível ponderar outros argumentos a partir de uma pesquisa desenvolvida sobre episódios de aprendizagem situados, fundamentada em outra perspectiva, que prefere pensar em estratégias de aprendizagem e que entende que tais estilos dependem sempre do contexto e da diversidade de propostas para que possam ser colocados em jogo. Diante da complexidade que envolve tal discussão, consideramos importante ponderar que, apesar de cada um ter seu próprio estilo de aprendizagem, categorizar os diferentes estilos individuais a partir de estilos gerais pode até ajudar a entender melhor  o processo, e ainda que isso não corresponda ao processo de aprendizagem descrito por renomados neurocientistas que estudam os processos de aprendizagem, tal perspectiva pode contribuir para diversificar as escolhas didáticas. Nesse tensionamento, reforçamos o argumento anterior  de que os jeitos de aprender se manifestam ou se constroem sempre a partir das situações propostas, seja no campo da didática e sua especificidade escolar e particularmente no caso das metodologias adotadas (no caso específico os EAS), seja nos mais diversos contextos de aprendizagem informal e a partir da diversidades da cultura mais ampla. 

“A experiência do conhecimento em rede e a afirmação da liberdade intelectual na globalização” foi a conferência do Prof. Paulo Dias, Reitor da UAB/Lisboa. Dispensável falar do carisma do professor que lindamente foi tecendo os fios de seu argumento: aprender em rede, construir redes de conhecimento, valorizar a diversidade, afirmar a liberdade intelectual na globalização. Entre tantas preciosidades encadeadas numa discussão epistemológica e política, destaco: a importância da literacia para afirmar as diversas formas de participação em rede e as ecologias da aprendizagem como um meio para construir a liberdade como possibilidade de afirmação do sujeito em rede; e a ênfase no papel da escola e na inovação pedagógica para conduzir as mudanças necessárias tanto nos contextos de aprendizagem como nos contextos mais amplos.


Em diversas mesas temáticas houve a participação de colegas brasileiros, entre eles, Marco Silva e Edmea Santos, ambos da UERJ. Em mesas diferentes, eles discutiram “A pedagogia da transmissão e a sala de aula interativa” e “Pesquisa-formação na cibercultura”, sempre provocando o pensar e instigando a discussão a respeito das questões que nos mobilizam e da complexidade do contexto em que estamos vivendo.


Interessante observar que em geral, na programação dos eventos científicos e acadêmicos europeus, sempre há momentos de confraternização, como boas-vindas e jantares sociais. E nesse evento não foi diferente. O jantar de boas-vindas no jardim do Castelo de Bragança foi muito especial e revelou toda a hospitalidade das pessoas do lugar. Uma atmosfera com a luz do fim do dia iluminando a paisagem do Douro embalada por música e dança dos mascarados deu outro tempero aos sabores locais. A interação com os pares propiciou encontros e trocas de pesquisa, entre outras dicas de viagem. No muro do castelo uma placa sinalizava a passagem do caminho de Santiago.   


E no jantar social de quase encerramento, além das delícias típicas, o prazer de estar em boa companhia planejando o  próximo encontro e o jogo de Portugal no dia seguinte. Que aliás, tive a sorte de assistir na Praça dos Aliados, em Porto... Um belo e inusitado fechamento do evento!!

quarta-feira, 13 de julho de 2016

Video e Formação: um olhar do Summer School Sirem 2016


“Video como instrumento de pesquisa reflexiva para a formação”. Esse foi o tema do Summer School da SIREM, realizado em Cagliari, na Sardegna, entre os dias 29/6 a 01/7/2016.

 A “Análise de vídeo” foi o foco da proposta da Profa. Rossella Santagata, University of California, Irvine (USA), com intenção de pensar a formação o mais próxima possível da prática, de modo a “aprender a partir do próprio trabalho em sala de aula”. Ou seja, refletir sobre a profissionalidade docente que se constrói a partir da análise e reflexão das práticas. A professora destacou o uso do vídeo como um interessante instrumento de formação, visto que a partir dos registros audiovisuais das situações de ensino-aprendizagem é possível se perguntar sobre a aula, como foi planejada, como os estudantes participaram e construíram suas aprendizagens para reestruturar a continuidade. O interessante nessa proposta é a possibilidade : identificar os objetivos, analisar as aprendizagens demonstradas pelos estudantes e como expressam seu pensar, analisar as escolhas didáticas, e como fazer diferente do que foi feito (outra forma de perguntar, de pensar, de organizar o grupo) como alternativas para que novas escolhas possam repercutir na aprendizagem. Desse modo, a profa. Santagata adota um modelo global da análise, Lesson Analysis Framework,  como um guia para a visão (a partir do registro audiovisual da aula) de modo a permitir um trabalho sobre as evidencias para identificar o que os alunos dizem/sabem/demonstram, o que não sabem e o que falta. Ou seja, a análise facilita o trabalho de tornar a compreensão dos alunos visíveis para o professor . Aliado a isso, se faz uma análise das escolhas didáticas: quais escolhas parecem ter favorecido a aprendizagem? Quais escolhas não foram adequadas? Sobre o que baseamos nossas reflexões? Para desenvolver tal olhar, há outro modelo de análise de vídeo, a Classroom Video Analysis, que possibilita identificar e problematizar como os professores raciocinam a partir do que veem em suas práticas. Como as práticas não são estanques, há uma série de perguntas como ideias-chave que o professor pode se fazer de modo a melhorar sua prática pedagógica, ancorado não apenas em hipóteses e intuições mas sobretudo em evidências como indicadores para ajudar na (auto)formação.

“O uso do vídeo na formação inicial e continuada” foi o tema do Prof. Pier Giuseppe Rossi, Università di Macerata. Ele discutiu uma experiência desenvolvida no curso de formação  baseado no principio da alternância (no trabalho na escola e no mundo universitário),  na teoria da ação a partir do diálogo entre sujeito e situação em que o vídeo é uma possibilidade para evidenciar as intencionalidades da ação, e as capacidades de interpretar as situações de sala de aula. o olhar profissional. Nesse sentido, ele apresentou sua experiência com o uso do vídeo no currículo da formação a partir de laboratórios propostos na Didática, no planejamento e desenvolvimento do estágio e na auto-observação e reflexão na ação. Isso me lembrou uma experiência que desenvolvi com uma turma de Pedagogia na UFSC, na disciplina de Estágio nos Anos Iniciais, quando trabalhamos com o vídeo de modo a registrar as performances das estudantes em sala de aula para que posteriormente pudessem “se ver no exercício da docência ” e discutir sobre a experiência, na perspectiva da vídeo-pesquisa. Sem dúvidas, um importante instrumento para alicerçar a reflexão e pensar nas escolhas didáticas.

“O vídeo visto pelo sujeito”, foi o tema da profa. Patrizia Magnoler, Università di Macerata, que enfatizou a importância de quem faz a ação poder se ver nela. A partir de uma pesquisa sobre as possibilidades da formação continuada incidir na transformação de suas práticas, ela discutiu a cultura profissional do professor a partir de um percurso de pesquisa-formação, desenvolvida de forma colaborativa. Identificando os espaços de mudança dos atores da pesquisa no próprio percurso da investigação, ela destacou o papel do vídeo no registro das práticas como possibilidade de guiar o olhar para identificar os próprios “nós”, simular um replanejamento de modo a possibilitar mudanças articuladas no ambiente. O percurso da ação envolve: perceber, significar, antever, planejar, agir, avaliar. E mais uma vez o vídeo é entendido como um instrumento que ajuda a refletir sobre a prática, e consequentemente, aprender com ela.

Por fim, a participação da Profa Marguerite Altet, Université de Nantes, França, e seus “Aportes de pesquisa sobre Ensino-Aprendizagem a partir da observação de práticas de ensino e alunos”. O ponto de partida da reflexão foi a articulação dos três campos: relacional, pedagógico e didático na proposta de uma tabela de observação de uma sequencia de sala de aula, em que os indicadores sugerem as “dimensões de  bom professor” . Ela destaca que embora seja utilizado como instrumento de pesquisa, também pode ser usado pelo próprio professor e na formação, pois para ela, “o professor pode se auto-avaliar e assim mudar sua prática”.

Por fim, o Congresso Internacional “Video digital e formação de professores”, coordenado pelos Professores Giovanni Bonaiuti e Giuliano Vivanet, ambos da Università di Cagliari. Nesse dia, uma amostra de diversas pesquisas desenvolvidas em diferentes universidades do país sobre o tema vídeo, com a presença dos professores acima mencionados, Alberto Cattaneo, Istituto Universitario Federale per la Formazione Professionale (CH), Pier Cesare Rivoltella, Università Cattolica del Sacro Cuore di Milano, Laura Menichetti, Università di Firenze, Ettore Felisatti e Pietro Tonegato, Università di Padova, Giuseppe Tacconi e Maurizio Gentile, Università di Verona, Ira Vannini, Università di Bologna, Maria Chiara Pettenati, INDIRE – Firenze, professores que têm participado das pesquisas com/sobre vídeo na formação e outros profissionais. Uma bela possibilidade de construção de redes.


Como não poderia deixar de mencionar, os encontros informais durante o evento asseguraram não apenas uma maior possibilidade de interação com colegas como agradáveis momentos de descontração num cenário marcado pela beleza, pelos sabores e  outras peculiaridades que fazem da Sardegna um lugar tão acolhedor...