terça-feira, 25 de outubro de 2016

Imagens e palavras: História em Quadrinho como experiência estética


Pensar a História em Quadrinho, HQ, como arte que nasceu no contexto de um jornal e com forte característica caricatural há mais de cem anos é, de certa forma, fazer uma viagem no tempo, de 25/10/1896 até o dia de hoje. Foi mais ou menos isso que aconteceu no Encontro “Imaggini&Parole:il fumetto come esperienza estética”, com Mariagrazia Portera, no contexto de um Curso de “Experiência Estética  na Formação de Crianças”, ministrado pelo Prof. Roberto Diodato, na UCSC de Piacenza.

Ao percorrer as diferentes etapas da história do HQ (o surgimento com Yellow Kid, a fase mais realista, o endereçamento diferenciado, a crise do  pos-guerra e com a difusão das novas mídias, a crítica por certas temáticas e a humanização de super-heróis, até a passagem do comic book ao graphic novel, que revolucionou a HQ. Com isso, começa a se ver a HQ de autores, a especialização autoral e o longo tempo de produção foi  construindo outro estatuto para esse híbrido de textos e imagens e seus processos de leitura, tanto como experiência unitária como multissensorial.

Mas o que significa pensar a HQ como experiência estética? Para alguns estudiosos, a HQ faz emergir diante de nossos olhos diferentes aspectos que fazem parte da interação leitor-autor no processo de fruição de uma história no espaço e tempo. E esse paradoxo do tempo na HQ envolve o congelar o tempo no instante singular para narrar e deixar fluir, completando os espaços brancos entre os quadros com a imaginação criativa do leitor.

Entre as diferentes estratégias de endereçamento que solicitam atitude ativa do leitor, os diferentes tipos de balões bem como  a disposição dos quadros que modifica o ritmo da leitura. Além disso, o ato de virar a página também pode ser considerado como uma surpresa que se apresenta nesse tempo próprio de fruição.

Nas possíveis analogias e diferenças entre HQ e cinema, destaca-se a percepção da simultaneidade. Aliás, é interessante perceber como o filme e a HQ representam a simultaneidade com diferentes formas de percepção. Como exemplo, Meta-Maus, de Art Spiegelman, e a justaposição entre passado e futuro que torna o presente e passado sempre presente;  o HQ Watchmen e sua adaptação cinematográfica solicitando diferentes formas de captar a simultaneidade no tempo; e também Here, de Richard Mcguire e sua verso digital em que o leitor decide o que e em que tempo quer ver a história na possibilidade de captar a ordem e simultaneidade dos planos que se sobrepõem. Como isso, mais uma vez em questão a ideia do autor e do leitor-autor.

Por fim, entre diversas modalidades que expressam essa obra de arte, o lembrete de que se aprende a ler/olhar/construir nexo na HQ, processo que envolve imaginação, habilidade lógica, atenção, paciência e satisfação  que deriva dessa feliz interação  com o mundo.

Diante disso, como não lembrar dos gibis de nossa infância? Das coleções dos nossos amigos, das trocas, de certos personagens que nos acompanham até hoje? Experiências estéticas, intuições e paixões que revelam um potencial a explorar com outros olhos e que na educação pode ser uma forma de participar da experiência. 

sábado, 22 de outubro de 2016

Atualidade de Bruno Munari, Sociologia Relacional e EAS DAY



Nesta semana começou o ciclo de conferências sobre atualidade de Bruno Munari, promovido pelo MUBA  e dedicado a temas munarianos, como: criança, imagem, palavras, arte, design, livros com os convidados: Alberto Munari (Munari e a pedagogia), Giorgio Lucini (Munari e os livros), Giovanni Anceschi (Munari e a arte), Stefano Salis (Munari e as imagens), Stefano Bartezzaghi (Munari e as palavras). No primeiro encontro realizado no dia 18/10/2016,  Alberto Munari iniciou algumas reflexões sobre o pensamento e a obra de Bruno Munari  a partir de um olhar autobiográfico. Ele chamou a atenção para o quanto seu pai era observador/observado, e citou  pequenas passagens de sua infância que demonstravam o quanto seu pai estava atento ao olhar infantil, que por vezes se construía como fulgurações a partir de suas provocações sobre a natureza e sobre o mundo. Falou do percurso criador e das inspirações fortuitas do cotidiano que se tornaram livros, poesia e tantas outras obras Munari que acompanhava desde pequeno. “Observar para entender ou entender para observar?”, provocou ele, argumentando sobre os processos diferentes mas indissoluvelmente ligados e  com isso reafirmou a importância da prática  da observação para promover a “consciência da existência de um universo de escolhas possíveis”, objetivo que Munari perseguiu ao longo de sua vida.  Pode parecer óbvio, mas o óbvio também precisa ser dito, pois entre tantas escolhas que fazemos no dia-a-dia e na pesquisa, perguntar se não é possível fazer de outro modo, é uma pergunta da ciência  mas que as crianças também nos fazem... e podemos reaprender a perguntar com elas, com toda transversalidade do seu pensamento.


Das perguntas e observações à análise semântica das relações sociais foi um salto propiciado pelo VII Seminario Nazionale di Sociologia Relazionale, no dia 20/10/2016, na UCSC. O seminário foi uma forma de homenagem ao Prof. Pierpaolo Donati, professor da Università degli Studi di Bologna, que acabou de se aposentar. O sociólogo e filósofo italiano é figura central da epistemologia relacional das ciências sociais, que reinterpretou a sociologia e filosofia moderna à luz das virada relacional. No contexto desse novo paradigma relacional, o tema do encontro foi a metodologia de pesquisa, que entre outros,  transitou pela superação da contraposição entre realismo e construtivismo, entre individual e holístico, na perspectiva de operar com os novos conceitos propostos e entender o “espaço relacional como espaço semântico”. Em relação às pesquisas sobre sociologia relacional e análise do social network análise semântica, Donati pontuou o desafio  da tentativa de “medir” o emergente. Também ponderou a importância de irmos além da análise qualitativa que é descritiva, e se isolada não leva a lugar algum, o que nos leva a pensar na quali-quanti, pois na análise relacional precisamos entender o que aconteceu e por que,  entender que os mecanismos relacionais não são causais  para poder se aproximar do emergente. Em seguida, diversos pesquisadores e debatedores que discutiam a importância obra de Donati  na pesquisa em geral, não apenas na pesquisa sociológica, também comentaram o livro lançado naquela ocasião “Lessico della sociologia relazionale”. Por fim, o próprio Donati concluiu os trabalhos  com chave de ouro, “o léxico da sociologia relacional  italiana  no panorama internacional: originalidade e desafios futuros.   Ao me aproximar desse paradigma que me parece de uma força extraordinária e chave de leitura para qualquer área, fiquei pensando na bela homenagem de uma obra que é fundamento tanto para o uso científico como para o âmbito didático, ou seja, que diz respeito aos aspectos de uma ontologia relacional como aos aspectos estruturais da pesquisa educativa em geral. Sem dúvida um belo material para se debruçar futuramente.

Do método de análise relacional à metodologia EAS para compreender o currículo, foi um dia.  Na terceira edição do EAS DAYocorrida no dia 21/10/2016, em Brescia, com o tema "EAS, educação para compreender o currículo", aliás, como tenho acompanhado o evento ano a ano, vale registrar o quanto aumenta o n. de participantes e de professores que tem adotado a referida metodologia nos diferentes níveis de ensino. A partir de uma síntese sobre aspectos históricos do currículo na escola italiana para chegar na fase atual, o destaque para as necessidades didáticas e culturais que o currículo hoje deve atender. Rivoltella destacou a função cultural do currículo para favorecer  a necessidade de “dar ordem aos caos”, em referência ao pensamento de Deleuze e Guattari. Para estes autores, as três grandes formas de pensamento – arte, ciência e filosofia – se distinguem pela natureza do plano traçado e daquilo que o ocupa. A filosofia traça um plano consistente; a ciência define o estado de coisas, as funções ou proposições referencias e conceituais; e a arte compõe sobre ação de figuras estéticas. Ou seja, para Rivoltella isso tudo também se faz no currículo e especificamente no EAS: ao articular o macro-micro do planejamento, o EAS desenha um plano, fixa conceitos e povoa o plano com personagens. E ao esclarecer cada aspecto, destacou as implicações  de trabalhar o currículo com EAS: o currículo breve e a possibilidade de selecionar os conteúdos do currículo a partir de sua disponibilidade e transferência, ou seja, a partir da validade e adequação e de sua possibilidade de transferir e aplicar o que se aprende em outras situações. Essa transferência de saber constrói e desenvolve o pensamento analógico, a capacidade intelectiva e as competências. Em síntese, os EAS promove a educação lenta, produz conhecimentos, desenvolve o pensamento e as competências, sempre considerando professores e estudantes protagonistas de tais processos... Em seguida, os workshops que possibilitaram operar tais ideias. 
Enfim, uma semana e tanto!!!